Não cabe indenização por roubo de relógio de luxo em estacionamento particular

Compartilhe essa postagem

Nos últimos tempos, o mercado de luxo tem crescido. Há projeções que, até 2025, o mercado de luxo possa faturar 1,22 trilhão de euros. A expectativa de crescimento do setor é alimentada pelo padrão de consumo, principalmente, dos millennials e da geração Z, parte da população que mais consome produtos de luxo. E, puxado pelo crescimento do consumo de produtos caros, também tem aumentado os casos de furtos e roubos de tais itens.

Pensemos na seguinte situação: um jovem empresário, ao descer de seu veículo, foi abordado por um motociclista armado anunciando o assalto, que adentrou a área do estacionamento logo após a sua chegada, sem nenhum embaraço, levando seu relógio de luxo da marca Rolex. Desejando ser ressarcido do prejuízo, o jovem empresário propôs ação contra a empresa responsável pelo estacionamento, alegando ser cliente da empresa, que está localizada no subsolo do prédio onde mantém seu escritório, e que o estacionamento não possuía cancela na entrada, não realizava controle de entrada e o sistema de monitoramento de câmera não funcionava no momento do roubo.

Será que a empresa de estacionamento de veículos é responsável por indenizar o jovem empresário pelo roubo ocorrido no interior do seu estabelecimento?

Conforme o Art. 14, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), é possível atribuir à empresa de estacionamento de veículos a obrigação de indenizar pelo roubo, ocorrido no interior do seu estabelecimento. Trata-se da aplicação da Teoria do Risco que prevê a assunção voluntária dos riscos inerentes ao exercício da atividade comercial pelo empresário. No entanto, o risco do roubo do relógio, como no caso hipotético, não está na esfera dos riscos suportado pela empresa que se dedica ao estacionamento e guarda de veículo.

A consumação do crime no interior do estacionamento não é fato suficiente para atribuir responsabilidade de indenização ao empresário do estabelecimento. O roubo do relógio mediante grave ameaça é ato ilícito exclusivo de terceiro. Ou seja, o prejuízo causado ao jovem empresário foi ocasionado por fato externo aos riscos suportados pelo empresário durante a prestação dos serviços oferecidos. Logo, as excludentes de responsabilidade, previstas na legislação nacional, são importantes para o exercício da atividade empresarial, pois eliminam os elementos estranhos aos riscos assumidos voluntariamente pelo empresário ao ofertar o serviço.

O jovem empresário, usuário do serviço do estacionamento, sabia da inexistência de cancelas e controle de acesso ao estacionamento, no entanto, por conveniência e comodidade, concordou em contratar e utilizar os serviços oferecidos pela empresa. Portanto, não é possível falar em frustração da expectativa de que o ambiente do estacionamento fosse seguro. Além disso, a inoperância do sistema de monitoramento por câmeras não foi fato preponderante para a ocorrência do roubo, nem sequer sua evitação. Como não havia expectativa de que o ambiente do estacionamento fosse seguro, e tão pouco o serviço prestado pela empresa (“guarda de veículo”) demonstrou ser ineficiente, não há que se falar em direito ao ressarcimento do prejuízo sofrido com o roubo do relógio.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já tem formado entendimento de que as empresas podem ser eximidas pelos prejuízos suportados por seus clientes em virtude da prática do crime quando reconhecido que o risco é alheio à sua atividade intrínseca. No exemplo, as empresas que se dedicam ao estacionamento e guarda de veículo não podem ser responsabilizadas pelo roubo de itens pessoais dos seus clientes, mesmo que seja dentro do estacionamento pelo qual é responsável.

É importante destacar que o STJ possui entendimento diverso para situação semelhante: roubo de cliente que acaba de efetuar saque em agência bancária em estacionamento de veículos oferecido pelo banco. Nesse caso, o STJ entende que é previsível a ocorrência desse tipo de evento no ambiente bancário, sendo risco inerente ao negócio. Portanto, os bancos devem ser responsabilizados pelos danos advindos de atuação criminosa quando ela ocorre em estacionamento disponibilizado como forma de captação de clientes, por gerar legítima expectativa de segurança aos consumidores.

Você também pode se interessar por: